Afirmar que Deus dê ao homem liberdade para pecar e lhe negue a liberdade para se converter, é abolir tanto o amor como a justiça de Deus. Admitir que lhe conceda 50 ou 80 anos de liberdade para pecar, e depois lhe negue essa liberdade por toda a eternidade, é o mesmo absurdo. Crer que Deus inflija um castigo infinito (eterno) por um erro finito (temporário) é não somente pecar contra o amor e a justiça de Deus, mas equivale também a um pecado mortal contra a lógica, uma vez que nenhum ser finito é capaz de um sofrimento infinito; o eterno, porém, é o infinito no tempo. O finito só pode suportar um sofrimento finito.
Suponhamos, meu amigo, que você esteja salvo, no céu, e seus pais e irmãos estejam perdidos para sempre no inferno; se você fosse capaz de gozar eternamente a sua felicidade, sabendo que outros são eternamente infelizes, seria você um egoísta muito maior do que os condenados; aqueles seriam egoístas no sofrimento, e você seria um egoísta no gozo. Se eu tivesse a escolha de simpatizar ou com esta ou com aquela parte, creio que as minhas simpatias seriam antes para os egoístas no sofrimento do que para os egoístas no gozo. A obtusidade do nosso senso de solidariedade universal, a impossibilidade de experimentarmos a humanidade como uma família e sentirmos em nós a vida universal do cosmos é que torna possível essa monstruosa teologia de um céu eterno para os bons e um inferno eterno para os maus. Tolstói, Gandhi, Schweitzer e muitos outros clarividentes acharam tão revoltante a idéia de eles gozarem ao lado de milhões de sofredores que nivelaram as diferenças entre si e os outros, ou fugindo da sua prosperidade, ou fazendo outros participarem dela. Isto é solidariedade universal.
Aliás, na Bíblia, a palavra “eterno” não significa sem fim. “Na presente eternidade casa-se e dá-se em casamento; mas na futura eternidade não se casa nem se dá em casamento.” (é o texto grego do primeiro século) Se há eternidades, no plural, eterno não quer dizer “sem fim” Idem: “Deus reina por todas as eternidades das eternidades.”
Aion, em grego, quer dizer uma longa duração de tempo, mas não um tempo sem fim.
Huberto Rohden
Do Livro: Orientando para a auto-realização, trecho do Capítulo: Inferno