O problema não é sofrer ou não sofrer- o problema está em saber sofrer ou não saber sofrer.
Nenhum homem profano sabe sofrer decentemente- mas
todo o iniciado pode sofrer serenamente, e até jubilosamente.
Que se entende por profano e iniciado?
Profano é todo aquele que está pró(diante) do
fanum(santuário); é todo o exotérico que contempla o santuário do homem pelo
lado de fora, e nunca entrou no seu interior... Iniciado é aquele que realizou
o seu inire, o seu ir para dentro, a sua entrada no santuário de si mesmo; esse
é um esotérico, um iniciado.
O profano é ignorante- o iniciado um sapiente de
sua realidade...
Dificilmente, poderá o sofredor modificar as
circunstâncias externas de sua vida que estão além do seu alcance, e por isto
não pode abolir ou suavizar a sua dor.
O que o sofredor pode modificar é somente a
substância interna de si mesmo, a atitude do seu Eu central, a sua consciência-
e com esta nova perspectiva de dentro, o fenômeno externo do sofrimento adquire
um aspecto totalmente diferente. Se o sofrimento não pode ser amável, pode ser
pelo menos tolerável.
Todo o sofrimento, repetimos, é tolerável, quando o
homem pode tolerar a si mesmo.
A amargura máxima do sofrimento não está no
fenômeno externo dele, mas na atitude interna do sofredor. E essa correta
atitude interna supõe autoconhecimento. Quando o sofredor sabe que não é o seu
Eu divino,mas apenas o seu ego humano que sofre, então pode ele sofrer
serenamente, e mesmo sabiamente-talvez até jubilosamente, por saber que ele
está construindo a "única coisa necessária que nunca lhe será
tirada."
A maior acerbidade do sofrimento ,como dizíamos,
está na sua absurdidade, no seu aspecto paradoxal, no seu caráter antivital e
antiexistencial-mas esse aspecto não vem do sofrimento em si, mas
unicamente da falsa perspectiva do
sofredor. O sofrimento do sofredor profano é necessariamente absurdo,
paradoxal, antivital, antiexistencial, e é capaz de levar o sofredor à revolta, à frustração,
ao suicídio, ou ao inferno em plena vida.
É pois de suprema
sabedoria que o homem mude de perspectiva e atitude- e isto, não quando
vítima de uma tragédia, mas em tempos de paz e bonança. Dificilmente, o
sofredor alcançará essa serenidade
durante o sofrimento, se antes dele, não a tiver alcançado... O homem deve
vacinar, imunizar todo o seu ser com o soro da verdade sobre si mesmo, para
que, na hora da tragédia, não sucumba ao impacto das bactérias mortíferas da
revolta e do desespero.
... Quem enxerga o porquê da sua existência
terrestre apenas nos gozos, já está em
vésperas de frustração. Quem confunde os objetivos da vida- fortuna, prazeres,
divertimentos- com a razão-de-ser da sua existência- autoconhecimento e
autorealização- é um profano, um exotérico, e não pode encontrar conforto na
hora do sofrimento.
É suprema sabedoria iniciar-se na verdade do ser
humano desde o princípio. Todos os objetivos da vida têm de ser integrados
totalmente na razão-de-ser da existência.
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