ACERVO VIRTUAL HUBERTO ROHDEN E PIETRO UBALDI

Para os interessados em Filosofia, Ciência, Religião, Espiritismo e afins, o Acervo Virtual Huberto Rohden & Pietro Ubaldi é um blog sem fins lucrativos que disponibiliza uma excelente coletânea de livros, filmes, palestras em áudios e vídeos para o enriquecimento intelectual e moral dos aprendizes sinceros. Todos disponíveis para downloads gratuitos. Cursos, por exemplo, dos professores Huberto Rohden e Pietro Ubaldi estão transcritos para uma melhor absorção de suas exposições filosóficas pois, para todo estudante de boa vontade, são fontes vivas para o esclarecimento e aprofundamento integral. Oásis seguro para uma compreensão universal e imparcial! Não deixe de conhecer, ler, escutar, curtir, e compartilhar conosco suas observações. Bom Estudo!

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domingo, 22 de novembro de 2015

A DESTRUIÇÃO E A VITÓRIA DO BEM

Comentário(s)

(Trechos do Livro A Nova Civilização do Terceiro Milênio de Pietro Ubaldi)

Os fundamentos desse tratado ( A Grande Síntese) são profundos. Ligam-se com a gênese do cosmos, encontramo-los até mesmo no pensamento criador de Deus. Essa síntese, abrangendo e unificando o conhecimento científico e filosófico do século, enuncia tão sólido conceito, que é possível pô-lo como base de nova civilização, e tão dinâmico que pode amparar-lhe o desenvolvimento. Trata-se de sistema orgânico e compacto em que todos os fenômenos, do campo cientifico ao moral e social, se prendem em lógica de ferro, de modo a impor-se à formação mental e racional do homem moderno. Trata-se de sistema que, ao mesmo tempo, dá a chave para a solução de todos os problemas, desde os teóricos e abstratos da filosofia até aos práticos e concretos de nossa vida como indivíduos e como sociedade. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milenio).

Os problemas sociais, no fundo são os mesmos fundamentais problemas da vida, isto é fames e libido, conservação do indivíduo e multiplicação da espécie, comida e sexo. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milenio).

Sob as mais desvairadas teorias sociais, sob as mais complexas estruturas ideológicas, o homem aplica simples leis biológicas, luta e progride biologicamente segundo os métodos da vida e para atingir-lhe os objetivos, seguindo estradas já praticadas na vida animal, pois a vida é uma só para todos e guiada por lei única, embora diversificadamente adequada aos diversos planos evolutivos. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milenio).

As verdadeiras premissas dos fenómenos sociais, enquanto fenômeno da vida, são biológicas e não filosóficas, metafísicas, políticas. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milenio).

A nossa assim chamada civilização é em grande parte questão de forma, simples verniz: A fase de legalidade atingida por nós é manto que cobre bem ou mal essa substancia biológica: o homem, se graças a ele pode parecer diferente, permanece substancialmente o que é na realidade biológica. Se se trata de ladrão ou delinquente o ordenamento jurídico poderá impedir que continue a prejudicar, mas ele permanece o que é. Isso, e não o que aparenta, é o que interessa conhecer. Posição social, poder econômico, valor aparente não tem importância. E até as classificações sociais, enquanto não corresponderem a classificação biológica, carecem de importância. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

O involuido para justificar-se perante a própria consciência e a consciência alheia e a si mesmo dar, ao menos, a ilusão de ter as mãos limpas, gosta sempre de assumir posição de justiceiro como agressor do rico e protetor do pobre. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

, nem mesmo aos ladrões. É inútil que o ladrão procure tornar justo seu furto, acusando de furto quem roubou antes dele. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

É de lei: se existe mérito, a propriedade perdura e rende; se não existe, dura pouco e não rende. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

A astúcia e a força, consideradas como armas úteis, tornam-se prejudiciais porque automaticamente se voltam contra quem as empregam. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

Todo indivíduo constitui unidade dupla, isto é, equilibrado paralelismo de forças emparelhadas, mas antitéticas. Ou melhor; a unidade compõem-se de metades inversas e complementares, em contraste e em equilíbrio. Desse contraste nasce a elaboração íntima que se chama evolução. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Da natureza negativa das forças do mal resultam três conseqüências importantes: 1.ª - Por parte do mal, absoluta impotência de construir para si mesmo e capacidade de desenvolver apenas atividade negativa, isto é, de embaraçar o trabalho construtivo alheio. Portanto, o mal subordina-se ao bem, existe apenas como forma de negação do bem, quer dizer, é função dele, como da luz depende a sombra. O mal, desse modo, nasceu escravo e seu domínio não passa de domínio negativo, de desagregação. 2.ª - Sua irresistível tendência para a auto-destruição. 3.ª - A subversão de todo rendimento se sua atividade, que assim, na realidade oposta às mentirosas aparências, não se resolve a seu favor, mas a favor do termo oposto - o bem. A destruição levada a cabo pelo mal se transforma, assim, em construção no campo de forças, inverso e contrário. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Se o mal nos faz mal é porque lhe pertencemos; faz-nos mal na medida e nos pontos em que lhe pertencemos, quer dizer, na proporção em que já se encontra dentro de nós mesmos ou, melhor, é desordem nossa, tal como livre¬mente a desejamos e incorporamos em nós mesmos. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Os problemas sociais, no fundo são os mesmos fundamentais problemas da vida, isto é fames e libido, conservação do indivíduo e multiplicação da espécie, comida e sexo. {P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio).

Todo indivíduo constitui unidade dupla, isto é, equilibrado paralelismo de forças emparelhadas, mas antitéticas. Ou melhor; a unidade compõem-se de metades inversas e complementares, em contraste e em equilíbrio. Desse contraste nasce a elaboração íntima que se chama evolução. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Apenas um olhar lançado no futuro, para que o pressintamos, nos enche de estupor. Geralmente, essas espíadelas no futuro reduzem-se a previsões fantásticas à Wells, limitando-se o escritor ao desenvolvimento dos motivos já em nossos dias atuantes, à perspectiva ampliada do atual estado de coisas. Ninguém fala de novos motivos, aqueles que de acordo com a lógica da evolução se introduzirão na vida. E o futuro reside exatamente neles. Exagera-se, ao invés, o progresso mecânico, colocado em primeiro plano; quanto à ciência da matéria, prossegue-se até à hipertrofia, sem suspeitar-se devam os equilíbrios da Lei, ao contrário, agir em direção oposta e compensadora, provendo o mais necessário: a sabedoria diretriz, que reordene, guie e portanto valorize as conquistas já realizadas. Não compreendemos ainda que os princípios atualmente em vigor, para não acabarem no aniquilamento, são corrigidos e não persistem; e, se não lhes adicionamos princípios complementares, não representam vantagem, mas dano. Essas previsões estão, pois, no caminho errado. Caímos no erro de acreditar que a evolução seja unilateral e retilínea e não deva o futuro passar de multiplicação, de continuação ampliada do presente. Por força da lei de equilíbrio, o caminho percorrido por determinado século não pode ser exatamente o prosseguimento puro e simples do seguido pelo século precedente. (P. Ubaldi- A Nova Civilização do 3º Milênio)

A História nos conta como se sucedem no tempo os vários momentos do funcionamento dos organismos coletivos. Estas palavras poderiam constituir-lhe a definição. O funcionamento do corpo social, expresso pela História não obedece ao acaso, mas segue o mesmo ritmo por nós encontrado noutros fenômenos. Em outras palavras: o transformismo fenomênico do complexo vivo do grande corpo coletivo obedece às mesmas leis do dinamismo universal. Ou mais exatamente: é dirigido enquanto pertencente ao binário da onda histórica. A vida das grandes unidades coletivas se desenvolve de acordo com movimento de amplas oscilações ascensionais e descendentes, de altos e baixos periódicos, movimento que repete o princípio das ondas do mundo dinâmico de que a vida participa.. Isso naturalmente acontece sempre que se trata de dinamismo como neste caso. Observemos os períodos e as características desse ritmo histórico. A História se desenvolve de acordo com respiração rítmica por nós reencontrada na física e especialmente no eletromagnetismo. A existência dos retornos históricos, já observados por Vico, é fenômeno de fácil observação. A trajetória típica dos movimentos fenomênicos de que falávamos acima segue o princípio desses retornos ou repetições, reproduzindo-os, todavia, em cada vez mais elevada posição; desse fato deriva a evolução. Desse modo, funciona também a história. Os acontecimentos humanos, sucedendo-se, tendem a repetir-se, ligam-se à lei dos retornos históricos que os obriga a percorrer de novo o velho caminho. Não nos surpreendamos por isso se a História parece não ensinar coisa alguma e se muitas vezes os mesmos erros são cometidos de novo pelos próprios dirigentes, que mais do que ninguém devem tê-la presente. Essa a lei do fenômeno, que só não se repetiria se progredisse sempre em direção evolutiva; é isso exatamente a coisa mais árdua na vida. Todavia, como na trajetória dos movimentos fenomênicos, a repetição não se transforma em cópia autêntica; quem observá-la bem lhe notará alguma diferença, embora pequena. Esta representa todo o valor da conquista, o resultado da experimentação. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

No ritmo histórico continuamente se alternam os períodos clássico e romântico. O primeiro, masculino, explosivo, guerreiro, materialmente conquistador, destruidor, fecundante e semeador, violento, involuído, materialista. O segundo, feminino, tranqüilo, conservador e espiritualmente conquistador, construtor, preparador e amadurecedor, pacífico, evoluído, espiritualista. Na trajetória dos movimentos fenomênicos o primeiro período representa a fase de queda involutiva, de retorno e de recuo; o segundo, a fase de ascensão evolutiva, de progresso, de ímpeto. Ambos os períodos, porém, são necessários porque têm funções diferentes e ao mesmo tempo complementares. O progresso caminha amparado nessas duas forças contrárias, impelido pelos seus choques e contradições. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

A dor é estado interior sobre a qual muitos elementos influem; entre eles, porém, não ocupa o primeiro lugar o choque proveniente do mundo físico, dado pelo determinismo físico. Tudo seria tão diferente, se víssemos as coisas por dentro, ao invés de vê-las por fora! Ver-se-ia a possibilidade de gozarmos em plena miséria e sofrermos no fastígio da riqueza. O mártir na cruz pode sentir-se mais feliz do que o rei no trono! Tamanho poder tem esse mundo interior, na dependência tão-somente do merecimento. O estado de prazer ou dor não se mostra como fato objetivo igual para todos, mas relativo e dependente das condições interiores individuais. Prazer e dor, imponderável resultante do embate de forças e não do determinismo do mundo físico, fundem-se na intimidade do eu. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Os dois estados, de prazer e dor, não dependem apenas das leis do ambiente físico, mas também de leis próprias, que se deixam influir muito pouco pelas primeiras. Se o fenômeno nasce no mundo externo, continua e conclui no mundo interior. O tangível estado de fato exterior não tem tanta importância quanto a sensação que consegue produzir. Vejamos, então, de que realmente depende essa sensação. Prazer e dor constituem ritmo que lhes regula o aparecimento alternado, a forma de relação, a intensidade relativa. Os dois extremos são inversos e complementares, ligados por lei de compensação e equilíbrio, para verificar-se cada um dos dois estados não basta o choque exterior, mas torna-se necessário que a lei interior do fenômeno, - a lei do merecimento, - de acordo com a justiça permita ao choque produzir efeito e transformar-se na devida sensação de prazer ou dor. Contudo, esse choque, seja qual for sua natureza, amortece a entrada da alma e não entra. O fenômeno é olhado em profundidade e entendido como desenvolvimento de forças; assim, liga-se à ordem universal, que não se pode romper, e deve equilibrar-se na justiça reguladora de todas as coisas. Principalmente: o aparecimento ou o desaparecimento dos referidos estados, de prazer e de dor, pode ser determinado por essa lei e não pelo arbítrio humano ou circunstâncias exteriores. O arbítrio e as circunstâncias podem ser injustos, mas a lei é justa, boa, protetora. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Tudo quanto nasceu de abuso representa desequilíbrio, isto é, sistema de forças desequilibrado e incapaz de manter-se senão à custa de desequilíbrio progressivamente maior; representa, pois, sistema que no seu próprio princípio carrega o germe de sua ruína. Por isso, o homem é tão ávido de energias, único meio capaz de sustentá-lo; mas, por mais esforços que faça, a lei de equilíbrio o assedia e se lhe contrapõe para reconduzi-lo à posição exata, em correspondência com sua real função biológica. (Pietro Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Hoje em dia a vida se apresenta feroz e desapiedada como nos tempos pré-históricos. Não estar armado de pedras lascadas, mas de metralhadoras, não estrangular seu semelhante com as mãos, e sim com os Bancos, representa apenas progresso formal, substancialmente fictício. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio) Os homens são desiguais; não pertencem ao mesmo grau evolutivo. Se os bens para manutenção da vida são-lhe indistintamente necessários, o modo por que os homens os procuram lhes exprimem a evolução, isto é, assume o papel de índice revelador da natureza humana. Aprofundemos a classificação dos tipos humanos com base no real valor biológico, de acordo com a real natureza do indivíduo; em face dessa natureza, como já dissemos, as distinções sociais têm valor todo fictício. Escalonemos, assim, os vários tipos humanos conforme os métodos de aquisição dos bens. Três podem ser esses métodos: furto, trabalho, justiça, próprios de três tipos biológicos que sobem do involuído ao evoluído, isto é, o selvagem, o administrador, o espiritualista. Constituem três raças de homens, correspondentes às três leis da vida: fome, amor, evolução. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Se olharmos em redor de nós vemos em todas as coisas dominar o desequilíbrio As vitórias são cada vez mais instáveis; as afirmações, levianas; tudo está confundido num turbilhão de loucura; a riqueza e o poder têm algo de raiva e desespero; todo bem é inseguro e dá-nos, mais do que alegria, o terror de vermo-nos despojados dele. Perdeu-se o senso da harmonia, da calma, da segurança e, por isso, da felicidade. A técnica, mais do que para criar e proteger, serve à morte e à destruição. As manifestações espirituais agonizam. A arte apresenta apenas expressões de bestialidade. Os cantares das mulheres são uivos de fêmea e estão a serviço da atração sexual. Os cânticos dos homens são gritos de revolta e servem ao roubo e à destruição. As maravilhosas descobertas modernas, quando não se constituem instrumento mortífero, concorrem muitas vezes para a multiplicação dessas expressões bestiais. As descobertas químicas reduzem-se quase sempre a, na agricultura, violentar os ciclos naturais; na medicina, a forçar as defesas orgânicas e impor-lhes efeito imediato, que, ao invés de ser salutar como se pensa, não passa de exploração mais rápida do organismo. Envenenamo-nos constantemente com sucedâneos e produtos sintéticos, maravilhas da ciência moderna. O que há em toda parte é revolta e substituição da Lei pelo homem; logo, deve haver em toda parte a respectiva penitência. Imposição e violência em lugar de harmonia e obediência. Parece que a mais angustiosa preocupação da terra é provocar o nascimento da dor. Se providencial ignorância não a limitasse, a ação humana chegaria a desintegrar o sistema solar. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio).

De semelhante progresso nascerá o novo tipo biológico, base das humanidades futuras. A mesma natureza do fenômeno nos indica quais as suas características, aliás redutíveis a uma só palavra: espiritualização. Isso significa tornar-se mais dinâmico, percuciente, sensível ou, seja, menos rude e obtuso. O novo tipo representará forma cada vez mais nervosamente selecionada e eleita, na progressiva exaltação das características elétricas da vida, em detrimento das características puramente físicas. A pesada musculatura animal, sempre mais inútil nas novas condições de vida, há de ser substituída por poderosa estrutura psíquica, cada dia mais necessária no novo mundo futuro. (. . . .)Observemos, para compreender melhor, este caso de sutilização da forma por meio de elaboração evolutiva, quer dizer, este caso de sensibilização e espiritualização. A princípio, e do ponto de vista biológico, a mão do homem foi um dos membros que o tronco produziu para facilitar a marcha, e isso já era a primeira manifestação de vontade interior dirigida para objetivo elementar. Depois, esse membro se destacou da terra e se transformou em órgão apreensor e instrumento de ação e de trabalho, como manifestação de vontade mais complexa e mais inteligente, embora presa ainda à forma material da estrutura ósseo-muscular, de que estava em estreita dependência. Hoje a mão se vai sempre transformando de instrumento físico em instrumento psíquico, vai tornando-se tentáculo nervoso cada dia mais ágil e sensível e passando de agente físico a órgão dirigente de outras energias, inclusive da muscular. Assistimos a um processo de desmaterialização, sensibilização e espiritualização, a que corresponde progressivo aumento de poder em extensão e profundidade. Continuando no mesmo caminho, a mão, gradativamente transformada de instrumento de marcha em órgão apreensor e, depois, em órgão diretor de forças, a mão se transformará em meio de recepção e transmissão de vibrações dinâmicas e psíquicas, antena para comunicar e receber energia e pensamento. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Cremos hoje que na vida se torne possível o agnosticismo, isto é, uma espécie de neutralidade espiritual, absenteísmo nas diretrizes. Assim, creram resolver o que não sabiam, acreditaram na possibilidade de fugirmos dos grandes problemas do ser. Desse modo, a imparcialidade se tornou ambigüidade e a amoralidade se transformou em imoralidade. Mas o agnosticismo significa não entender e não resolver nada, significa mentir a si mesmo. Não podemos viver sem ação e não podemos agir sem determinada orientação pessoal. Apenas em teoria agnosticismo pode significar imparcialidade. Na prática significa obediência aos próprios instintos. A vida está toda inteira em suas posições. É impossível permanecer neutro na luta entre o bem e o mal, não podemos deixar de atingir determinado grau de evolução, de existir sob forma definida. Em todo ato, em todo campo o espírito penetra e torna-se impossível não assumir uma posição moral qualquer.(P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

No sistema compensado e equilibrado da natureza, não pode haver hipertrofia sem a correspondente atrofia. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Apenas no dinamismo universal se caracteriza uma corrente, isto é, uma força, isolando-se e individuando-se, se manifesta, logo se determina no próprio dinamismo universal, por força da lei de equilíbrio, uma corrente contrária; esta, embora isolando-se e individuando-se, torna-se evidente como força oposta a contrabalançar a primeira. (Eis o atrativo especial das coisas proibidas, exatamente porque proibidas). De acordo com esse princípio, nenhum fenômeno foge aos limites preestabelecidos e, embora sendo contínuo movimento de evolução, não se desenvolve senão de acordo com plano traçado pela Lei. Proíbe-se desse modo todo desenvolvimento hipertrófico e unilateral, todo excesso de desarmonia e desproporção no conjunto. Assim, toda manifestação pode processar-se apenas se enquadrada nos limites assinalados pelos princípios diretores. O desenvolvimento é, pois, dirigido harmonicamente, protegido contra a catástrofe de desproporção insuportável e permitido apenas na forma e na medida úteis às finalidades evolutivas da vida e do bem. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

A humanidade de hoje crê ter-se de súbito civilizado apenas porque descobriu alguma lei exterior da vida, que lhe permite mais cômodo desfrutamento dos recursos naturais. Trata-se de domínio alcançado sobre algumas forças tornadas em parte obedientes, para atingir bem-estar de que nos pomos a gozar, ignorando-lhe as conseqüências. Esse domínio também poderá servir para causar-nos a morte cientificamente, em larga escala, porém não nos torna mais adiantados. Isso não pode chamar-se civilização. De mudanças profundas de orientação, que interessem à motivação da atividade humana, nem se fala. Hoje em dia a vida se apresenta feroz e desapiedada como nos tempos pré-históricos. Não estar armado de pedras lascadas, mas de metralhadoras, não estrangular o seu semelhante com as mãos, e sim com os Bancos, representa apenas progresso formal, substancialmente fictício. Civilização que deixa intactos os instintos bestiais do homem e, além disso, lhe oferece meios mais poderosos de satisfazê-los, não merece o nome de civilização. Hoje, ao invés de havermos progredido, descemos a tal ponto que perdemos o sentido do que seja civilização e mudamos o significado dessa e de outras palavras sublimes. A verdadeira civilização está mais dentro do que fora de nós; é mais um poder das qualidades da personalidade que um poder originado nos meios exteriores e no domínio material; é progresso no espírito, implica em mudança do comportamento humano em profundidade e não apenas em superfície. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

No sistema compensado e equilibrado da natureza, não pode haver hipertrofia sem a correspondente atrofia. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Na ordem universal todo fenômeno se apresenta como campo de forças fechado, fato que lhe caracteriza a individualidade e lhe limita a ação. O eu fenômenico está encerrado em seu ritmo interior, equilibrado em duplo e inverso movimento respiratório, em oscilação que constitui a base da íntima elaboração chamada evolução. Essa bipolaridade é universal. Toda unidade se nos apresenta como formada de duas partes iguais em que, contradizendo-se, ela se inverte e se compensa, mas também encontra sua estrutura simétrica e equilibrada. Esse vaivém de forças antitéticas em campo fechado, essa correspondência de antíteses e simetria, de inversão e complementariedade, esse íntimo ritmo dualístico compõem a fisionomia que o pensamento e a vontade da Lei imprimiram às individuações fenomênicas, quer dizer, significam estrutura orgânica e funcional. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

Quanto mais a retidão de uma verdade ou de uma instituição lhe houver conquistado a estima pública, tanto maior atração exerce sobre homens inescrupulosos que procuram apropriar-se dela em busca de vantagens pessoais. Quem mais fama tem de honesto esse é o ladrão. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)

O progresso material de nossos dias representa, assim, desproporcionado desenvolvimento unilateral. O ponto critico tangível, resultante desse desequilíbrio e revelador dessa desproporção, é a moderna guerra de destruição. Trata-se de fase transitória, formadora de excesso que as leis da vida devem corrigir e reequilibrar, reagindo em sentido oposto. Desse modo, demonstra atrofia espiritual a crença de que o problema do mundo seja problema técnico, utilitário, de recursos e matérias-primas. Mas por isso mesmo surge a complementação do organismo com o desenvolvimento do lado atrofiado. A guerra de destruição nasceu do fato de que, o novo poder da técnica, sendo mecanicamente acessível a todos e, assim, à maioria involuída, foi empregado sem discernimento. os resultados práticos do progresso acabaram indo às mãos do homem ainda não moralmente desperto, sem preparo, insuficientemente sábio para fazer bom uso do novo poder. Foi o mesmo que pôr faca em mão de criança. Por isso antigamente a sabedoria era mistério para o povo. O progresso mecânico acabou sendo entrega de arma perigosa a mãos inconscientes. O homem de hoje em dia, moralmente deficiente, foi tomado de surpresa diante das novas possibilidades que a ciência lhe oferecia. Corpo de gigante com cérebro de criança de peito. Resultado: entrechocar-se o homem com dolorosa experiência, para que aprenda na dor e ela o obrigue a completar-se do lado do espírito. Assim, através do sofrimento, as leis da vida hão de reequilibrar o homem, que, a par de progresso material, conseguirá correspondente e proporcionado progresso espiritual. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

O cálculo das probabilidades faz-nos crer que os fatos, porque se repetiram muitas vezes, devam continuar repetindo-se sempre. Mas os equilíbrios da vida reclamam exatamente o contrário. Exatamente porque determinado fato se repetiu tantas vezes deve ceder o passo à posição contrária. Por isso, em lugar de continuação do passado, como vulgarmente se pensa, as situações futuras são, quase sempre, resultado de retorno ao passado. Confiamos muito nas aparências, mas especialmente na História, como vimos, as aparências enganam. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Aos detentores do poder e aos lideres das finanças e da indústria pode o problema do mundo parecer simples problema técnico. Não é, porém, problema técnico somente. E isso porque, se as grandes agitações sociais se desencadeiam para conquista de objetivos concretas, utilitários, de interesse econômico, a verdade é que a vida, além de vasta e complexa, é una e unitária. Se é esse, pois, seu aspecto, sua fase construtiva de momento, ainda existem sempre, embora momentaneamente adormecidos, em estado de latência, os outros aspectos da vida, principalmente o moral, hoje estacionário. É justamente esse o lado oposto, mas complementar, do hipertrófico progresso material de nossos dias. Ora, uma vez que as leis da vida impõe, em todos os pontos, desenvolvimento harmônico e progresso equilibrado, é lógico esperar-se, agora, correspondente desenvolvimento espiritual, para compensar o contemporâneo excesso de progresso material. Quem conhece a organicidade funcional do universo deve admitir que o esforço genético das formas biológicas não pode criar o novo e gigantesco indivíduo coletivo, filho dos nossos tempos, assim desproporcionado, sem equilibradas correspondências simétricas, só membros e forças, sem paralela sabedoria diretora desses membros e dessa força. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

Como o contraste condiciona a percepção, assim a contradição temida pelos lógicos constituí, pelo contrário, a base da vida e até mesmo do pensamento. O termo oposto representa o controle necessário, o freio inibitório, o contra-impulso probante. A reação reforça a resistência, a oposição garante a verdade. Quem conquista autoridade cria inimigos, é certo, mas apenas no campo em que a exerce e na medida em que a possui. Trata-se de compensações automáticas verificáveis em qualquer campo, apenas uma força se manifesta, exatamente porque toda unidade se constitui de uma dupla de contrários. O forte é forte; mas, quanto mais forte mais inimigo atrai. O fraco é fraco; porém não cria inimigos, o inerme é benquisto O homem desarmado atrai, o homem armado causa repulsa. Muitas vezes esses contra-impulsos se conservam em estado potencial, latente, à espera de condições adequadas à sua manifestação. A vida social está repleta dessas forças, às vezes comprimidas e concentradas como explosivo. E é nos momentos de mudança de fase, de novas combinações, durante os quais transitoriamente a estabilidade dos equilíbrios precedentes se desloca à procura de novos, é nesses momentos que as forças latentes e comprimidas explodem.(P. Ubaldi - A Nova Civilização do 3º Milênio)



Concluamos, para aqueles que ainda não vêem, com as palavras de S. Paulo: "Ninguém se iluda: se algum dentre vós imagina possuir a sabedoria deste mundo, torne-se louco para se tornar sábio; porque a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus." Certamente muitos não entendem. Mas, antes de sorrir como céticos, é bom refletir que os fundamentos da sociedade geralmente foram estabelecidos por homens de fé e não por homens apenas de ação. Estes vivem da vida alheia; fecundam, mas não criam; ajudam, mas não despertam a vida. Antes, os primeiros, que parecem utopistas e loucos é que a fazem surgir espalhando centelhas de luz; são os sábios sonhadores, e não os práticos, os que dão os maiores impulsos à humanidade. É bom refletir que o homem mais dinâmico e revolucionário não é o que grita e assalta, mas o que pensa, penetra a verdade e a anuncia sem agredir; que o homem mais destruidor no presente é o que pacificamente cria no futuro, limitando-se, diante do mal, a suportá-lo com paciência, a denunciá-lo cândida e, se preciso, heroicamente a todos. É bom recordar que o ataque mais poderoso, o ataque final, é desfechado, sob forma mansa e persuasiva, pelos verdadeiros demolidores, que ferem as raízes, e não pelos que seguem os caminhos da força que agem externamente e excitam reações; o verdadeiro assalto é aquele que, através do amor e da verdade, leva á convicção. (P. Ubaldi - A Nova Civilização do Terceiro Milênio)

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

SÓCRATES - RESPOSTA A KRITON

Comentário(s)


- Por quê ? - perguntou Sócrates.

- Porque amanhã te vão matar – respondeu Kriton.

- Matar? A mim? - tornou tranquilamente o sábio – Ninguém pode matar Sócrates.

E, puxando a pele da mão e batendo no osso do crânio, acrescentou: - Kriton, você pensa que isto aqui é Sócrates? Isto é um invólucro ao redor de mim, mas isto não sou eu. Eu não sou meu corpo, eu sou a minha alma. Sócrates é imortal!

Na manhã seguinte, conforme ordem do governo de Atenas, bebeu ele a taça de cicuta, que pôs termo à vida física desse grande cristão antes de Cristo.

Ora, todo homem realmente espiritual é socrático, e sabe com absoluta certeza que o seu verdadeiro Eu é divino, eterno, imortal, e não pode jamais estar em contradição com Deus, porque a alma é Deus mesmo em forma individual.”

(Huberto Rohden - Profanos e Iniciados)

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

TRANSTORNO DEPRESSIVO

Comentário(s)

Artigo de Divaldo Franco publicado no jornal A Tarde, coluna Opinião, em 05-11-2015.

Para que se instale o transtorno depressivo no ser humano, existem causas endógenas (hereditariedade, enfermidades infectocontagiosas, sequelas delas) e exógenas, também denominadas como eventos da vida (culpa, depressão, ansiedade, solidão, perda do sentido existencial...).

Considerando o volumoso número de vítimas nestes dias, acredita-se que em futuro não muito distante pode transformar-se na causa primeira dos óbitos, superando as neoplasias malignas, as cardiopatias e outras terríveis enfermidades. Numa cultura social individualista, consumista e sexista, não se podem aguardar outros que não sejam esses os resultados degradantes e funestos.

A perda dos objetivos existenciais exarados no amor, ante as ofertas do prazer incessante, alucina o ser humano, que se transfere para o desespero do poder de qualquer expressão ao invés da aquisição sublime do ser. Enquanto a ciência e a tecnologia avançam ampliando os horizontes do conhecimento e ensejando bênçãos, o comportamento moral desce aos mais baixos níveis, recordando idênticos períodos de degradação de superadas civilizações, que naufragaram na ilusão do gozo indevido. Para poder-se atingir determinadas metas atuais, com as exceções compreensíveis, é necessário que se alcance os desvãos do despudor e da vulgaridade, a fim de chamar-se a atenção e conseguir-se as migalhas da luz dos holofotes que consomem aqueles que as buscam.

Nunca houve tanta solidão humana: moral, fraternal e afetiva como nesse período de amarguras íntimas e de glórias externas. Extenuado pelas extravagâncias ou batalhas contínuas, o ser humano exausto cai na depressão. Indispensável pensar-se no valor da existência para si mesmo e para o próximo, vivendo-se, como ensinava S. Francisco: – Senhor! Fazei-me instrumento de vossa paz... Somente assim será possível crescer-se na vertical do dever, restaurando-se a alegria natural que sustenta a vida digna, sem drogadição e luxúria de qualquer tipo.


terça-feira, 27 de outubro de 2015

A IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO

Comentário(s)

Por Aloísio Wagner

Relacionarmo-nos é antes de tudo conhecer-nos a nós mesmos. O outro é sempre o espelho por onde nos vemos.

Quando estamos em isolamento geralmente não percebemos as sutilidades de nosso ego que se manifesta por meio de nossas relações expressando desequilíbrios, impaciência, vaidade, orgulho, egoísmo, etc. Tornando então fundamental o contato com o outro. 

Nenhum homem ou ambiente tem a capacidade de nos fazer maus ou bons. 

Quando o somos, apenas deixamos externalizar aquilo que já existia em estado latente. Aquilo que estava implícito se torna explícito.  Daí a importância de um entrelaçamento de ideias, pensamentos, sentimentos, pois o homem solitário tem dificuldade de perceber suas doenças e feridas internas, que somente em relação passa a identificar. Muitos inconscientemente fogem e a Lei o alcança, exigindo profundas transformações num trabalho incessante, pois queremos nos furtar ao invés de vê-la como chance e oportunidade de  transformação.


Quando estamos numa relação, somos exigidos pela Lei divina a conquistar a perfeição espiritual. Sedes perfeito como vosso Pai celestial é perfeito, e o termômetro desta perfeição, para nós mesmos, é  compreender e amar, seja quem for, amigo ou inimigo, esposa ou vizinho, conhecido ou desconhecido, aceitando suas limitações e imperfeições, e ajudando-os a alcançar uma consciência mais lúcida. 

Não devemos esperar nada de ninguém. Nem atenção, carinho, reconhecimento, respeito, amor, etc. Nossos atos não devem ter interesse de satisfação de nossos desejos.  Agir esperando uma recompensa é sinal de egoísmo.

Quem busca recompensa externa  ainda não encontrou a substância interna, que é o verdadeiro alimento, que é vida, que é Deus, dentro de nós.   

terça-feira, 20 de outubro de 2015

INICIAÇÃO TOTAL

Comentário(s)

Por Huberto Rohden 

Enquanto algo é meu, 
Não pode triunfar o EU. 
Meus são bens de fortuna, 
Meus são amores de homem ou mulher, 
Meus são filhos, parentes, amigos, 
Meu é o prestígio social de que gozo, 
Meus são o corpo e o intelecto.

Nada disto, porém, sou Eu. 
Eu sou o sujeito central, 
Meus são os objetos periféricos. 
E esses objetos são velhos companheiros meus, 
Crudelíssimos tiranos, 
Desde o meu nascimento, 
Poucos decênios atrás. 

Esses objetos são velhos companheiros, 
Onipotentes ditadores, 
Do gênero humano, 
Há muitos séculos e milênios.

Haverá esperança de que eu possa 
Realizar a minha libertação?
Que eu possa viver, aqui na terra, 
Sem esses objetos escravizantes? 
Sem esses queridos "meus"? 
Sem esses idolatrados fetiches?...

Não! ninguém pode desfazer-se desses ídolos
E continuar a viver.
Já compreendi que iniciação
Não é algo que eu possa adicionar
A minha vida horizontal,
Como um belo enfeite,
Como um colar de pérolas.

Compreendi que iniciação
A morte total desta vida
E algo inédito e inaudito, 
Até agora vivida... 

Iniciação não é continuação 
De algo preexistente 
Não!

É o fim de tudo que foi e é 
E o início de tudo que deve ser... 
Iniciação é algo virgem, 
Um novo "fiat lux" creador. 
Não é remendo novo em roupa velha, 
Não é vinho recente em odres gastos 
Não! 

Iniciação é morte total 
Do "homem velho" 
E ressurreição integral 
Do "homem novo". 
Nem um átomo da bagagem do ego 
Passa para além da fronteira. 
Porque o ego só conhece o que é "dele" 
E ignora o que é "ele". 

O meu verdadeiro Eu nada sabe 
Desse mundo dos meus,
Desses pequenos e grandes nadas 
Que parecem ser algo. 
Iniciação é verdade suprema, 
Incompatível com a menor das ilusões.

Ergue-te, pois, sobre asas levíssimas,
Meu grande Eu divino,
Meu átomo crístico!
E lá das excelsas alturas
Dominarás todos os "meus",
Sem seres por eles dominado...

Albert Schweitzer e os párias na África

Comentário(s)

Vultos e episódios da Época Contemporânea



Schweitzer, Albert. Filósofo, teólogo luterano, organista interprete de Bach, tornou-se médico missionário, e sua mulher enfermeira, na África Equatorial. Recebeu o Prêmio Nobel da paz em 1952 pelos seus esforços pela "Irmandade das Nações". Nasceu em 14 de janeiro de 1875, em Kaysersberg, Alta Alsacia, Alemanha (hoje França) e faleceu em 04 de setembro de 1965, em Lambaréné, Gabão.

Filho mais velho de um pastor luterano Schweitzer estudou filosofia e teologia na Universidade de Strasbourg, onde obteve seu grau de doutor em filosofia em 1899. Foi simultaneamente professor de filosofia e pregador na Igreja de São Nicolau, e no ano seguinte ele recebeu doutorado em teologia. Seu livro "A Questão do Cristo Histórico" (1906) fez dele uma figura mundial em teologia. Nesta e em outras obras ele salienta as visões escatológicas (referentes ao fim do mundo) de Jesus e São Paulo, afirmando que suas atitudes foram tomadas na expectativa do fim iminente do mundo.

Durante esses anos Schweitzer também se tornou um músico completo, começando sua carreira como organista em Strasbourg em 1893. Charles-Marie Widor, seu professor de órgão em Paris, reconheceu Schweitzer como um intérprete de Bach de uma percepção impar e pediu-lhe para escrever um estudo sobre a vida e arte do compositor. O resultado foi J.S. Bach: le musicien-poète (1905). Neste trabalho, Schweitzer via Bach como um místico religioso e comparou sua música a forças impessoais e cósmicas do mundo natural. Em 1905 Schweitzer anunciou sua intenção de tornar-se um médico missionário e dedicar-se ao trabalho filantrópico e em 1913 tornou-se doutor em medicina. Com sua mulher, Hélène Bresslau, que havia praticado como enfermeira para acompanhá-lo, ele foi para Lambaréné, no Gabão, colônia francesa na África Equatorial.

Lá, às margens do rio Ogooué, Schweitzer, com a ajuda dos nativos, construiu seu hospital, o qual equipou e manteve com seus recursos, mais tarde suplementados por doações de indivíduos e fundações de muitos países. Preso lá como estrangeiro inimigo (alemão) e depois levado para a França como prisioneiro de guerra durante a Primeira Guerra Mundial, ele cada vez mais voltou sua atenção para questões mundiais e foi levado a escrever o seu Kulturphilosophie (1923; "Philosophy of Civilization"), no qual lançou sua filosofia pessoal de "reverência pela vida", um princípio ético relativo a todas as coisas vivas, que ele considerava essencial para a sobrevivência da civilização.

Schweitzer retornou à África em 1924 para reconstruir o hospital arruinado, o qual ele relocou cerca de duas milhas acima no rio Ogooué. Uma colônia de leprosos foi anexada mais tarde. Por volta de 1963 havia lá 350 pacientes com seus familiares no hospital e 150 pacientes na colônia de leprosos, todos atendidos por cerca de 36 médicos brancos, e enfermeiras e trabalhadores nativos. Schweitzer nunca abandonou inteiramente seu interesse intelectual e musical. Ele publicou Die Mystik des Apostels Paulus (1930 - O misticismo de Paulo Apóstolo), deu aulas e recitais de órgão pela Europa, fez gravações, e retomou sua edição dos trabalhos de Bach, iniciados com Widor em 1911 (Bachs Orgelwerke, 1912-14). Seu discurso ao receber o Prêmio Nobel da Paz, Das Problem des Friedens in der heutigen Welt (1954 - "O problema da paz no mundo de hoje"), teve circulação mundial.

A despeito de críticas ocasionais das práticas médicas de Schweitzer, como sendo autoritária e primitiva, e a despeito da oposição algumas vezes levantada contra seus trabalhos teológicos, sua influência continua a ter um apelo moral forte, freqüentemente servindo como uma fonte de encorajamento para outros missionários médicos.

R.Q.Cobra
Doutor em Geologia
e bacharel em Filosofia.
1999

Para citar este texto: Cobra, Rubem Queiroz - NOTAS: Vultos e episódios da Época Contemporâmea. Site www.cobra.pages.nom.br, INTERNET, Brasília, 1997 
("www.geocities.com/cobra_pages" é "Mirror Site" de www.cobra.pages.nom.br)

sábado, 26 de setembro de 2015

O QUE É A AÇÃO CORRETA?

Comentário(s)

Auckland, Nova Zelândia, 1ª palestra 28 de março, 1934.

Amigos, penso que cada um de nós está aprisionado seja num problema religioso seja numa luta social ou num conflito econômico. Cada um de nós está a sofrer pela falta de compreensão destes variados problemas, e tentamos resolver cada um deles por si; isto é, se têm um problema religioso, pensam que o vão resolver pondo de lado o problema econômico ou social e centrando-se inteiramente no problema religioso, ou se têm um problema econômico pensam que vão resolver esse problema econômico limitando-se inteiramente a esse conflito específico. Ao passo que eu digo que não podem resolver estes problemas por si sós; não podem resolver o problema religioso por si só, nem o problema econômico nem o problema social, a menos que vejam a inter-relação entre os problemas religiosos, sociais e econômicos.

Aquilo a que chamamos problemas são meramente sintomas, que aumentam e se multiplicam porque não agarramos a vida toda como uma coisa só, mas dividimo-la em problemas econômicos, sociais ou religiosos. Se olharem para todas as variadas soluções que são oferecidas para os vários padecimentos, verão que lidam com os problemas em separado, em compartimentos estanques, e não tomam os problemas religiosos, sociais e econômicos compreensivamente como um todo. Ora é minha intenção mostrar que enquanto lidarmos com estes problemas em separado apenas aumentamos o desentendimento, e portanto o conflito, e desse modo o sofrimento e a dor; até que lidemos com o problema social e com os problemas religiosos e econômicos como um todo compreensivo, não dividido, mas de preferência vendo a ligação delicada e subtil entre aquilo que chamamos problemas religiosos, sociais ou econômicos – até que vejam esta ligação real, esta ligação íntima e subtil entre os três, seja qual for o problema que possam ter, não o vão resolver. Apenas incrementarão a luta. Embora possamos pensar que resolvemos um problema, esse problema surge novamente de uma forma diferente, e assim vamos através da vida resolvendo problema após problema, luta após luta, sem compreender totalmente o pleno significado do nosso viver.

Portanto, para compreender esta ligação íntima entre aquilo a que chamamos problemas religiosos, sociais e econômicos, tem que haver uma completa reorientação do pensamento – isto é, cada indivíduo tem que deixar de ser uma peça de engrenagem, uma máquina, seja na estrutura social seja na religiosa. Olhem e verão que a maior parte dos seres humanos são escravos, meras peças de engrenagem nesta máquina. Não são realmente seres humanos, apenas reagem a um meio estabelecido e por isso não existe verdadeira ação individual, pensamento individual; e para descobrir essa relação íntima entre todas as nossas ações, religiosas, políticas ou sociais, têm que pensar como indivíduos, não como um grupo, não como um corpo coletivo; e essa é uma das coisas mais difíceis de fazer, que os indivíduos saiam da sua estrutura social, ou religiosa, e a examinem com espírito crítico, para descobrir o que é falso e o que é verdadeiro nessa estrutura. E então verão que já não estão preocupados com um sintoma, mas estão a tentar descobrir a causa do próprio problema, e não apenas a lidar com os sintomas.

Talvez alguns de vocês digam no fim da minha palestra que nada lhes dei de positivo, nada em que possam claramente trabalhar, um sistema que possam seguir. Eu não tenho nenhum sistema. Penso que os sistemas são perniciosos, porque podem de momento aliviar os problemas, mas se simplesmente seguirem um sistema são escravos dele. Apenas substituem o velho sistema por um novo, o que não origina compreensão. O que origina compreensão não é procurar um novo sistema, mas sim descobrirem por si próprios, como indivíduos, não como uma máquina coletiva mas como indivíduos, o que é falso e o que é verdadeiro no sistema existente, e não substituir o velho sistema por um novo.

Ora, ser capaz de criticar, ser capaz de questionar, é o primeiro requisito essencial para qualquer homem pensante, para que possa começar a descobrir o que é falso e o que é verdadeiro no sistema existente, e por esse motivo nesse pensamento há ação, e não mera aceitação. Assim durante esta palestra, se quiserem compreender o que vou dizer, tem que haver espírito crítico. O espírito crítico é essencial. O questionamento é correto, mas nós fomos treinados para não questionar, para não criticar, fomos cuidadosamente treinados para nos opormos. Por exemplo, se eu disser algo que não vão gostar – como o farei, espero – naturalmente começarão a opor-se, porque a oposição é mais fácil do que descobrir se o que digo tem algum valor. Se descobrirem que o que eu digo tem valor, então há ação, e por isso terão que alterar toda a vossa atitude perante a vida. Por esse motivo, como não estamos preparados para fazer isso, criámos uma hábil técnica de oposição. Isto é, se não gostarem de qualquer coisa que estou a dizer, apresentam todos os vossos preconceitos profundamente enraizados e obstruem-na, e se eu estiver a dizer algo que os possa magoar, ou que os possa aborrecer emocionalmente, refugiam-se nestes preconceitos, nestas tradições, neste pano de fundo; e reagem a partir desse pano de fundo, e a essa reação chamam crítica. Para mim não é espírito crítico. É apenas oposição habilidosa, que não tem valor.

Ora bem, se forem todos Cristãos – e presumivelmente são todos Cristãos – talvez eu vá dizer algo que podem não compreender, e em vez de tentarem descobrir o que quero transmitir, imediatamente se refugiarão por trás das tradições, por trás dos preconceitos profundamente enraizados e das autoridades da ordem estabelecida, e a partir dessa fortaleza, na defensiva, atacarão. Para mim isso não é crítica: isso é uma maneira engenhosa de não atuar, de evitar a ação plena, completa.

Se quiserem entender o que vou dizer, pedia-lhes que fossem realmente críticos, não habilidosos na vossa oposição. Ser crítico requer muita inteligência. A crítica não é cepticismo, ou aceitação; isso seria igualmente estúpido. Se simplesmente dissessem, “Bem, eu sou céptico sobre o que diz”, isso seria tão estúpido como simplesmente aceitar. Ao passo que a verdadeira crítica consiste, não em transmitir valores, mas em tentar descobrir os verdadeiros valores. Não é assim? Se conferirem valores às coisas, se a mente conferir valores, então não estão a descobrir o mérito intrínseco da coisa, e a maior parte das nossas mentes está treinada para conferir valores. O dinheiro, por exemplo. Abstratamente o dinheiro não tem valor. Tem o valor que lhe damos. Isto é, se quiserem o poder que o dinheiro dá, então usam o dinheiro para ter poder, portanto estão a dar um valor a algo que inerentemente não tem valor; assim, da mesma maneira, se descobrirem e compreenderem o que vou dizer, têm que ter esta capacidade de crítica, que é realmente fácil se quiserem descobrir, se quiserem encontrar, não se disserem, “Bem, não quero ser atacado. Estou na defensiva. Tenho tudo o que quero, estou perfeitamente satisfeito. ” Então, uma tal atitude é perfeitamente irremediável. Estão então aqui apenas por curiosidade – e a maioria provavelmente está – e o que eu vou dizer não terá significado, e por isso dirão que é negativo, nada construtivo, nada positivo.

Portanto por favor lembrem-se que esta tarde vamos descobrir, considerar em conjunto, quais são as coisas falsas e as verdadeiras na situação social e religiosa existente; e para fazer isso por favor não tragam continuamente os vossos preconceitos, sejam Cristãos, ou de qualquer outra seita, mas tenham antes esta atitude inteligente e crítica, não só a respeito do que vou dizer, mas com respeito a tudo na vida, o que significa a cessação da procura de novos sistemas, e não a procura de um novo sistema que, quando encontrado, será de novo pervertido, corrompido. Na descoberta do falso e do verdadeiro nos sistemas social, religioso e econômico – o falso e o verdadeiro que nós próprios criamos – nessa descoberta, impediremos as nossas mentes e corações de criar falsos ambientes nos quais provavelmente a mente será de novo aprisionada.

A maior parte de vocês está à procura de um novo sistema de pensamento, um novo sistema de economia, um novo sistema de filosofia religiosa. Porque procuram um novo sistema? Vocês dizem, “Estou insatisfeito com o antigo”, isto é, se estiverem a procurar. Ora eu digo, não procurem um novo sistema, mas em vez disso examinem o próprio sistema em que estão presos, e então verão que nenhum sistema de nenhuma espécie originará a inteligência criativa que é essencial para a compreensão da verdade ou Deus ou seja lá qual for o nome que gostam de lhe dar. Isso significa que não seguindo qualquer sistema vão descobrir a realidade eterna; mas só a vão encontrar quando vocês, como indivíduos, começarem a compreender o próprio sistema que edificaram através dos séculos, e nesse sistema descobrirem o que é verdadeiro e o que é falso.

Portanto por favor lembrem-se disso – que não lhes estou a dar um novo sistema de filosofia. Penso que estes sistemas são gaiolas para manter presa a mente. Não ajudam o homem, são apenas impedimentos. Estes sistemas são um meio de exploração. Ao passo que se vocês, como indivíduos, começarem a questionar, verão que nesse questionamento criam conflito, e a partir desse conflito compreenderão – não na mera aceitação de um novo sistema que é apenas outro soporífero que os adormece e os transforma em mais uma máquina.

Vamos portanto desocbrir o falso e o verdadeiro nos sistemas existentes – os sistemas da religião e da sociologia. Para descobrir o que é falso e o que é verdadeiro, temos de ver em que se baseiam as religiões. Ora, eu falo de religião como a forma cristalizada de pensamento que se tornou no mais elevado ideal da comunidade. Espero que acompanhem tudo isto. Isto é, as religiões tal como são, não como vocês gostariam que fossem. Tal como são, em que se baseiam? Qual é o seu fundamento? Quando olham, quando examinam e pensam realmente com espírito crítico sobre isso – não trazendo as vossas esperanças e preconceitos, mas quando realmente pensam sobre isso – verão que se baseiam no conforto, dando-lhes consolo quando estão a sofrer. Isto é, a mente humana está continuamente à procura de segurança, de uma posição de certeza, seja numa crença ou num ideal ou num conceito, e portanto estão continuamente a procurar uma certeza, uma segurança, em que a mente se refugie como conforto. Ora o que acontece quando estão continuamente à procura de segurança, proteção, certeza? Naturalmente isso gera medo, e quando há medo tem que haver conformidade. Por favor, não tenho tempo de entrar em detalhes. Fá-lo-ei nas minhas várias palestras, mas nesta quero pôr tudo concisamente, e se estiverem interessados podem ponderar sobre isto, e depois podemos discuti-lo em reuniões de perguntas e respostas.

Portanto as pretensas religiões conferem o padrão de conformidade à mente que procura segurança nascida do medo na busca de conforto; e onde há procura de conforto, não há compreensão. As nossas religiões em todo o mundo, no seu desejo de dar conforto, no seu desejo de os conduzir a um padrão específico, de os moldar, dá-lhes vários padrões, moldes, seguranças, através daquilo a que chamam fé. Essa é uma das coisas que exigem – fé. Por favor não interpretem mal. Não se adiantem a mim. Elas exigem fé, e vocês aceitam a fé porque ela lhes proporciona um refúgio do conflito da existência diária, da luta contínua, das preocupações, dores e sofrimentos. Portanto dessa fé, que tem que ser uma fé dogmática, nascem as igrejas, e daí são estabelecidas ideias, crenças.

Ora para mim – e por favor lembrem-se disto, quero que critiquem, não que aceitem – para mim todas as crenças, todos os ideais são um obstáculo porque os impedem de compreender o presente. Vocês dizem que as crenças, os ideais, a fé, são necessários como um farol que os orientará através da confusão da vida. Isto é, estão mais interessados em crenças, em tradição, em ideais e na fé, do que em compreender a própria confusão. Para compreenderem a confusão não podem ter uma crença, um preconceito; têm que olhar para ela completamente, agarrá-la com uma mente clara, com uma mente não corrompida, não com uma mente que está influenciada por preconceitos específicos a que chamamos um ideal. Portanto onde há uma procura de conforto, de segurança, tem que haver um padrão, um molde, no qual nos refugiamos, e por isso a preconceber o que deve ser Deus, e o que deve ser a verdade.

Ora para mim, existe uma realidade viva. Existe algo que devém eternamente, algo fundamental, real, duradouro, mas que não pode ser preconcebido; não requer crenças, requer uma mente que não esteja acorrentada a um ideal tal como um animal está atado a um poste, mas que pelo contrário, requer uma mente que esteja continuamente a mover-se, a experimentar, nunca permanecendo. Eu afirmo que há uma realidade viva; chamem-lhe Deus, verdade, o que quiserem, coisa que é de muito pouca importância – e para compreenderem isso, é preciso haver suprema inteligência, e por isso não pode haver qualquer conformidade, mas antes o questionamento dessas coisas falsas e verdadeiras em que a mente se encontra aprisionada. E verão que a maior parte das pessoas, a maior parte de vocês são religiosamente propensos, estão à procura da verdade, e essa mesma procura indica que estão a fugir do conflito do presente, ou que estão insatisfeitos com a situação presente. Por isso tentam descobrir o que é real; isto é, deixam a situação que cria conflito e fogem e tentam descobrir o que é Deus, o que é a verdade. Por isso essa procura é a negação da verdade, porque estão a fugir – há evasão, desejo de conforto, de segurança. Por isso, quando as religiões se baseiam, como o fazem, na oferta de seguranças, tem que haver exploração; e para mim as religiões tal como são subsistem em nada mais do que numa séria de explorações. Aquilo a que chamamos os mediadores entre o nosso presente conflito e essa suposta realidade tornaram-se os nossos exploradores, e eles são os sacerdotes, os mestres, os professores, os salvadores; porque eu afirmo que só através da compreensão do conflito presente com todo o seu significado, com todos os seus delicados matizes – só assim podem descobrir o que é real, e ninguém os pode conduzir a isso.

Se ambos, o inquiridor e o professor, soubessem o que é a verdade, então ambos poderiam ir na sua direção; mas o discípulo não pode saber o que é a verdade. Por isso a sua inquirição sobre a verdade só pode existir no conflito, não longe dele, e assim, para mim, qualquer professor que descreva o que é a verdade, o que é Deus, está a negar isso mesmo, esse algo incomensurável que não pode ser medido por palavras. A ilusão das palavras não lhes dá segurança, e a ponte das palavras não os pode conduzir a esse algo. É somente quando vocês, como indivíduos, se começarem a aperceber no conflito imenso, da causa, e por consequência da falsidade desse conflito, que descobrirão o que é a verdade. Ali existe a felicidade eterna, a inteligência; mas não nesta coisa espúria chamada espiritualidade que é apenas uma conformidade, conduzida pela autoridade através do medo. Eu afirmo que existe algo extremamente real, infinito; mas para o descobrir o homem não deve ser uma máquina imitativa, e as nossas religiões não são nada mais que isso. E além disso, as nossas religiões em todo o mundo mantêm as pessoas separadas. Isto é, vocês com os vossos preconceitos específicos, autodenominando-se Cristãos, e os Indianos com as suas crenças específicas, autodenominando-se Hindus, nunca se encontram. As vossas crenças mantêm-nos separados. As vossas religiões estão a mantê-los separados. “Mas”, dizem vocês, “se os Hindus pudessem ao menos tornar-se Cristãos, então haveria uma unidade”, ou os Hindus dizem, “Deixemos que se tornem todos Hindus.” Mesmo então há divisão, porque a crença necessita de uma divisão, uma distinção, e por esse motivo a exploração e a luta contínua da diferença de classes.

Dizemos que as religiões unem. Pelo contrário. Olhem para o mundo fraccionado em seitas pequenas e tacanhas, lutando umas contra as outras para aumentar o seu número de membros, a sua riqueza, as suas posições, as suas autoridades, pensando que elas são a verdade. Só há uma verdade, mas não podem chegar a ela através de nenhuma seita, através de nenhuma religião. Para descobrir o que é verdade na religião, e o que é falso, não podem ser uma máquina; não podem aceitar as coisas como elas são. Fá-lo-ão se estiverem satisfeitos, e se estão satisfeitos não me ouvirão, e a minha palestra será inútil. Mas se estão insatisfeitos ajudá-los-ei a questionar corretamente, e desse questionamento descobrirão o que é a verdade, e nessa descoberta do que é verdadeiro descobrirão como viver amplamente, completamente, extaticamente; não com esta constante luta, batalhando contra tudo para vossa própria segurança, à qual chamam virtude.

Mais uma vez, este medo que é criado através da procura de segurança, procura refúgio na sociedade. A sociedade nada mais é que a expressão do individual multiplicada por milhares. Afinal, a sociedade não é uma coisa misteriosa. É o que vocês são. É premente, controladora, dominadora, tortuosa. A sociedade é a expressão do indivíduo. Esta sociedade oferece segurança através da tradição, a que chamamos opinião pública. Isto é, a opinião pública diz que possuir, possuir bens, é perfeitamente ético, moral, e dá-lhes distinção neste mundo, confere-lhes honras; vocês são pessoas notáveis neste mundo. É isso que, tradicionalmente, é aceito. É essa a opinião que criaram como indivíduos, porque é isso que vocês procuram. Todos vocês querem ser alguém no estado, seja Sir Qualquer Coisa ou Lord, e todo o resto, como vocês sabem, que se baseia na possessividade, nas posses; e isso tornou-se moral, verdadeiro, bom, perfeitamente cristão, ou perfeitamente hindu. É a mesma coisa. Ora nós chamamos a isso moralidade. Chamamos moralidade ao ajustamento a um padrão. Por favor, não estou a pregar o contrário disso. Estou a mostrar-lhes a falsidade disso, e se quiserem descobrir atuarão, não procurarão o reverso. Isto é, vocês consideram as posses, já sejam a vossa mulher, os vossos filhos, os vossos bens, vocês consideram isso perfeitamente moral. Agora suponham que tinha nascido uma outra sociedade em que as posses fossem más, onde esta ideia de possessividade fosse eticamente proibida – que entrasse na vossa mentalidade como a possessividade entra agora pelas circunstâncias, pela situação, pela opinião. Então a moralidade perde todo o seu significado, a moralidade é então uma mera conveniência. Não a percepção correta das coisas, mas o engenhoso ajuste às circunstâncias – a que chamam moralidade. Suponham que querem, como indivíduos, não ser possessivos, vejam o que têm que combater! Todo o sistema da sociedade não é senão possessividade. Se o compreendessem e não fossem levados pelas circunstâncias que não são chamadas morais, então vocês, como indivíduos, teriam que começar a afastar-se desse sistema voluntariamente, e não teriam que ser levados como cordeiros a aceitar a moralidade da não-possessividade.

Atualmente são forçados quer gostem quer não, quer pensem que é sensato ou não; são forçados pelas situações, pelo meio que criaram, porque são ainda possessivos, e agora talvez apareça um outro sistema que os leve ao oposto – a ser não-possessivos. Certamente não é moralidade; é apenas timidez ser forçado pelo meio a ser possessivo ou não-possessivo. Ao passo que, para mim, a verdadeira moralidade consiste em compreender totalmente o absurdo da possessividade e combatê-la voluntariamente; e não ser conduzido de uma maneira ou de outra.

Agora, se olharem, esta sociedade está baseada na consciência de classes que é mais uma vez a consciência da segurança. Da mesma maneira que as crenças se tornam em religiões, também as posses se tornam na expressão da nacionalidade. Da mesma maneira que as crenças separam as pessoas, condicionam as pessoas, mantêm-nas separadas, também a possessividade, expressando-se como consciência de classes e tornando-se em nacionalidade, mantém as pessoas separadas. Isto é, toda a nacionalidade se baseia na exploração da maioria pela minoria para seu próprio benefício através dos meios de produção. Essa nacionalidade, através do instrumento do patriotismo, é um processo de guerra. Todas as nacionalidades, todos os países soberanos, têm que se preparar para a guerra; é o seu dever, e não adianta serem pacifistas e ao mesmo tempo falar de patriotismo. Não podem falar de fraternidade, e depois falar sobre Cristianismo, porque isso nega-a; não mais aqui que na Índia, ou em qualquer outro país. Na Índia podem falar sobre Hinduísmo e dizer que somos um só, que toda a humanidade é uma só. São apenas palavras – hipocrisia.

Portanto todas as nacionalidades são um processo de guerra. Quando falava na Índia, disseram-me (presentemente os Hindus estão a travessar uma fase dessa doença do nacionalismo), “Olhemos primeiro pelo nosso país porque há tanta gente a morrer de fome; depois podemos falar sobre a unidade da humanidade”, que é a mesma coisa de que falam aqui. “Protejamo-nos e depois falaremos sobre unidade, fraternidade, e todo o resto.” Ora, se a Índia está realmente preocupada com o problema da fome, ou se vocês estão realmente preocupados com o problema do desemprego, não podem lidar apenas com o problema de desemprego da Nova Zelândia; é um problema humano, não um problema de um grupo específico chamado Nova Zelândia. Não podem resolver o problema da fome como um problema Indiano, ou como um problema Chinês, ou o problema do desemprego como um problema Inglês, ou Alemão, ou Americano, ou Australiano, mas têm que lidar como ele como um todo; e só podem lidar com ele como um todo quando não forem nacionalistas, e não forem explorados através do processo de patriotismo. Vocês não são patriotas todas as manhãs quando acordam. Só são patriotas quando os papéis dizem que têm que o ser, porque têm que conquistar o vosso próximo. Somos por isso bárbaros, e não os que invadem o vosso país. O bárbaro é o patriota. Para ele o seu país é mais importante que a humanidade, que o homem; e eu digo-vos que não resolverão os vossos problemas, este problema econômico e de nacionalidade, enquanto forem Novo Zelandeses. Só o resolverão quando forem seres humanos verdadeiros, livres dos preconceitos nacionalistas, quando deixarem de ser possessivos, e quando a vossa mente não estiver dividida pelas crenças. Então poderá haver verdadeira unidade humana, e então o problema da fome, o problema do desemprego, o problema da guerra, desaparecerá, porque vocês considerarão a humanidade como um todo e não como algum povo específico que quer explorar outro povo.

Veem portanto o que está a dividir o homem, o que está a destruir a verdadeira glória de viver na qual, unicamente, podem encontrar essa realidade viva, essa imortalidade, esse êxtase; mas para a encontrar têm que ser em primeiro lugar indivíduos. Isso significa que têm que começar a compreender, e por consequência a agir, para descobrir o que é falso no sistema existente, e assim, como indivíduos, formarão um núcleo. Não podem alterar as massas. O que são as massas? Vocês próprios multiplicados. Esperam que as massas atuem, esperando que por algum milagre haja uma mudança completa do dia para a noite, porque não pensam, não querem agir. Enquanto esta atitude de espera existir, haverá cada vez maior luta, cada vez mais sofrimento, falta de compreensão; a vida torna-se uma tragédia, algo sem valor. Ao passo que, se vocês, como indivíduos, agirem voluntariamente porque querem compreender e descobrir, então tornar-se-ão responsáveis, então não se tornarão reformadores, então haverá uma mudança completa, não baseada na possessividade, nas distinções, mas na verdadeira humanidade na qual há afeto, há pensamento, e por isso um êxtase de viver.

Jiddu Krishnamurti, O que é a Acção Correcta? Filosofia. Textos de J.Krishnamurti em Português.


http://www.jiddu-krishnamurti.net/pt/krishnamurti-o-que-e-a-accao-correcta/1934-03-28-krishnamurti-o-que-e-a-accao-correcta

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

ENQUANTO HOUVER CRIANÇAS...

Comentário(s)

Artigo de Divaldo Franco publicado no jornal A Tarde, coluna Opinião, em 24-09-2015.



Nada obstante o aluvião de fatos agressivos e perversos, quase nos acostumando com a violência que domina a Terra, há pouco mais de duas semanas fomos surpreendidos com mais uma página de dor que comoveu o mundo e tornou-se um símbolo da imensa tragédia dos refugiados da Líbia e de outros países, buscando amparo na Europa. Foi o encontro do cadáver do pequenino Aylan Kundi, de apenas 3 anos, numa praia da cidade de Bodrum, na Turquia. A postura em que se encontrava, dava a impressão de estar levemente adormecido com parte do rosto semienterrada na areia. Havia sido vítima de um naufrágio no qual, além dele, desencarnaram um irmãozinho e a genitora. A fotografia do militar carregando-o após o encontro é significativa e atesta que, no coração do ser humano, apesar de todas as aflições desta hora difícil, permanece viva a chama do amor.

Aquele pequeno e frágil ser, cuja existência foi arrebatada pela loucura que tomou conta da Terra, na forma de uma guerra vergonhosa, como se todas não o fossem, em que os interesses de algumas nações poderosas do Ocidente estão em jogo, comoveu o mundo, e demo-nos conta que somente com o retorno à solidariedade e ao respeito aos direitos alheios lograremos viver em paz. Diversos países europeus que enriqueceram com a escravidão negra, com os tesouros da África sofrida e das Cruzadas vergonhosas contra o Oriente, estão sendo convidados a devolver o furto e o roubo, a resgatar atitudes impiedosas e os crimes desalmados dos colonizadores que destruíram vidas, comunidades e impuseram os seus costumes e crenças, recebem agora as vítimas do seu cruel domínio no passado. São centenas de milhares e talvez milhões, que ora se voltam para as terras da esperança, conduzindo os males e horrores que os assinalam e irão gerar problemas imprevisíveis no porvir. No entanto, enquanto houver crianças, como assinala o poeta indiano Rabindranath Tagore, temos a certeza de que Deus ainda está de bem com a humanidade.


Divaldo Franco escreve quinta-feira, quinzenalmente.



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