Senhor – Rei divino projetado às sombras da
manjedoura -, diante do teu berço de palha recordo-me de todos os
conquistadores que te antecederam na terra.
Em rápida digressão, vejo Sesóstris, em nome
do Egito sábio, e Cambises, o rei dos persas, ocupando o vale do Nilo, antes
poderoso e dominador. Recordo as lutas sanguinolentas dos assírios, disputando
a hegemonia do seu império dividido e infeliz.
Nabopolassar e Nabucodonosor reaparecem à
minha frente, arrasando Ninive e atacando Jerusalém, cercados de súditos a se
banquetearem sobre presas misérrimas para desaparecerem, depois, num sudário de
cinza.
Não observo, contudo, apenas o gentio, na
pilhagem e na discórdia, expandindo a própria ambição; o povo escolhido, apesar
dos desígnios celestes que lhes fulguram na Lei, entrega-se, de quando em
quando, á sementeira de miséria e ruína; revoluções e conflitos ceifam as doze
tribos e o orgulho desvairado compele irmãos ao extermínio de irmãos.
Revejo os medos, açoitados pelos cimerianos e
citas.
Dario surge, ao meu olhar assombrado, envolvido
nos esplendores de Persépolis para mergulhar-se em seguida, nos labirintos do
túmulo.
Esparta e Atenas, entre códigos e espadas, se
estraçalham mutuamente, no impulso de predomínio; numerosos tiranos, dentro de
seus muros, manobram o cetro da governaça, fomentando a humilhação e o luto.
Alexandre, à maneira de privilegiado, passa
esmagando cidades e multidões, deixando um cortejo de lagrimas, atrás da
fanfarra guerreira que lhe abre caminho à morte, em plena mocidade.
E os romanos, Senhor? Desde as alucinações dos
descendentes de Príamo ao último dos imperadores, deposto por Odoacro, jamais
esconderam a vocação do poder, arrojando povos livres ao despenhadeiro da
destruição...
Todos os conquistadores vieram e dominaram,
surgindo na condição de pirilampos barulhentos, confundidos, à pressa, num
turbilhão de desencanto e poeira. Tu, porém, Soberano Senhor, Te contentou com
o berço da estrebaria!
Ministros e sábios não te contemplaram, na
hora primeira, mas humildes pastores se ajoelharam sorridentes, diante de Ti,
buscando a luz de teus olhos angelicais...
Hinos de guerra não se fizeram ouvir à tua
chegada libertadora; todavia, em sinal de reconhecimento, cânticos abençoados
de louvor subiram ao Céu, dos corações singelos que te exaltavam a Estrela Gloriosa,
a resplandecer nos constelados caminhos.
Os outros, Senhor, conquistaram à custa de
punhal e veneno, perseguição e força, usando exércitos e prisões, assassínio e
tortura, traição e vingança, aviltamento e escravidão, títulos fantasiosos e
araçás de ouro...
Tu, entretanto, perdoando e amando, levantando
e curando, modificaste a obra de todos os déspotas e legisladores que procediam
do Egito e da Assíria, da Judéia e da Fenícia, da Grécia e de Roma, renovando o
mundo inteiro.
Não mobilizaste soldados, mas ensinaste a um
punhado de homens valorosos a luminosa ciência do sacrifício e do amor. Não
argumentaste com os reis e com os filósofos; no entanto, conversaste
fraternalmente com algumas crianças e mulheres humildes, semeando a compreensão
superior da vida no coração popular...
E por fim, Mestre, longe de escolheres um
trono de púrpura a fim de administrares o Reino Divino de que te fizeste
embaixador e ordenador, preferiste o sólido da cruz, de cujos braços duros e
tristes ainda nos envias compassivo olhar, convidando-nos à caridade e à
harmonia, ao entendimento e ao perdão...
Conquistador das almas e governador do mundo,
agora que os teus tutelados afiam as armas para novos duelos sangrentos, neste
século de esplendores e trevas, de renovação e morticínio, de esperanças e
desilusões, ajuda-nos a dobrar a cerviz orgulhosa, diante do teu singelo berço
de palha!...
Mestre da Verdade e do Bem, da Humildade e do
Amor, permite que o astro sublime de teu Natal brilhe, ainda, na noite de
nossas almas e estende-nos caridosas mãos para que nos livremos de velhas
feridas, marchando ao teu encontro na verdadeira senda de redenção.
Irmão X