Na ligeira abertura do seu sari brilhavam os olhos, quais duas
gotas de luz.
O som dos
seus braceletes e
dos guizos nos
pés me penetraram os
ouvidos, enquanto o perfume de jasmins presos aos seus cabelos me
entonteceram de emoção.
Imediatamente o corcel
dos desejos galopou
pelo meu corpo
e a ansiedade
me turbou a lucidez.
Segui-a até o templo, e era uma deusa que se prosternou para
adorar um outro deus.
Após a oferenda, olhou-me com profunda alegria, passando por
perto de mim.
Falei-lhe baixinho, quase sem voz:
— Seguirei teus passos, aonde quer que fores.
E ela respondeu-me:
— Sou o destino dos anseios que matam; sou água que não sacia a sede,
e prazer que não extingue o desejo.
— Ainda assim
- respondi-lhe, ofegante
- acompanharei a
tua viagem esperando fruir o licor das tuas concessões.
E porque em
mim era o
amor jovem e
impetuoso que pulsava, ela
se deteve e redargüiu, penalizada:
— Eu sou Kâma (*) e tu
és Mamas (1). Adormece as tuas
ansiedades e afoga-as logo no rio
do esquecimento, a
fim de que
sejas feliz quando
logres conquistar Atma
(2) com sacrifício e renúncia. Porque és moço e puro te deixarei aqui e
seguirei a sós.
Via-a desaparecer banhada
pelo sol ardente
e, ardendo de
desejos, mergulhei profundamente
no Budhi (3) para viver e alcançar o Samadhi. (4)
_____________
(*) Kâma — Desejos e
paixões inferiores.
(1) Mamas — A mente.
(2) Atma — O Eu
legítimo; a consciência Superior da Divindade.
(3) Budhi — A razão
iluminada.
(4) Samadhi — Paz em
plenitude.
Rabindranath Tagore/ Por Divaldo
Franco. Livro: Pássaros Livres, poema III.