A
civilização moderna, voz da terra, tem um sistema muito seu para sufocar o
espírito. Não o combate frente a frente; não o nega, mas observa-o. Não lhe
diz: "Tu não existes", porque isto seria um reconhecimento do direito
à defesa. Diz-lhe: "Eu existo, apenas eu", e assim o suprime sem o
matar. Aturde-o com os rumores externos, com distrações contínuas, com o
dinamismo mecânico e vazio que lhe dá a ilusão de fazê-lo viver, mas que em
verdade o deixa morrer. Rouba-lhe cada minuto do tempo que ele tem para
refletir, para se encontrar a si mesmo. Arranca-o da solidão para atirá-lo no
vórtice das metrópoles. Não lhe dá tréguas. E a vida exterior exige, de fato,
toda a nossa atenção. Não nos podemos deter nas margens. Nos raros momentos de
paz percebemos que há dentro de nós um estranho descontentamento, uma
insatisfação amarga, um vazio e uma fome, uma tristeza que a civilização não
admite porque não tem meio algum para a curar. O mundo desistiu de se opuser
deste problemas do espírito, tão importantes em épocas que hoje se chamam de
primitivas, atrasadas. Parece que o homem perdeu completamente o sentido das
coisas espirituais, tanto que nem mesmo as discute e nada se preocupa com elas.
Esta é a solução mais radical, ou seja, a supressão do problema, a extirpação
das qualidades necessárias para o enfrentar. O mundo preocupa-se com outras
coisas. O seu gênio construiu a máquina e agora está certo de que com ela
ganhou mais um escravo que lhe torna mais cômoda a vida. E a máquina é quem
manda e se faz servir. O homem criou a máquina, mas não criou ainda o juízo
para servir-se dela, o que é muito mais difícil. E corre, freqüentemente só por
correr, para servir à máquina que corre.
(Pietro
Ubaldi – Trechos do livro “História de um Homem”)