Ó mundo ingrato e
falaz!
Ó mundo cruel e avaro!
Por que me negaste tudo
O que eu de ti esperava?...
Adorei-te intensamente,
Idolatrei-te perdidamente...
Da manhã até à noite,
Sem cessar,
Andei em busca dos teus tesouros...
Da manhã até à noite,
Da noite até à manhã,
Engendrando planos e projetos
Para captar a matéria-morta
E a carne-viva que prometes
A teus servidores.
Mas tu me davas precariamente
O que eu desejava em abundância.
Por isto, enojado de ti,
Ó mundo ingrato e falaz,
Abandonei-te, amargurado,
E fui em demanda de Deus.
Voltei-te as costas,
Em mudo protesto.
Falei mal de ti,
Ó mundo cruel e avaro,
A todos os meus amigos
E sócios de decepção.
Mas...oh, ingrata surpresa!
Não encontrei sossego em Deus...
Algo insatisfeito me distanciava
E me mantinha longínquo
Do Deus propínquo.
Algo como imaturidade,
Mais adivinhado que sabido,
Me enchia de nostálgica saudade,
E evocava em mim imagens profanas,
De mundos idos, semi-delidos,
De uma vida não vivida...
E eu voltei as costas a Deus
E, impetuoso, me lancei a teus braços,
Ó mundo querido e idolatrado!...
E tu me deste tudo, tudo
Que desejar pudesse,
No vasto âmbito das minhas ambições.
Cumulaste-me de riquezas,
De honras e glórias sem par.
E eu me banhava, voluptuosamente,
Em tuas tépidas ondas,
Longe, bem longe, das praias de antanho,
Intensamente satisfeito comigo
E contigo, ó mundo fagueiro
Mas, eis que a grande
fome
Que eu tinha de ti,
A fome que tão prodigamente
Me saciaste,
Se converteu em fastio,
Num fastio imenso de ti
E num fastio de mim mesmo,
Teu devotado adorador...
E novamente me afastei de ti,
Não por me teres negado o que te pedira,
Mas por me teres dado tudo, tudo,
Mais do que te pedira,
Mais do que desejar pudesse...
Saciastes todas as minhas fomes,
E essas fomes todas,
Tão exuberantemente saciadas,
Criaram em mim um fastio tão grande
Que não mais te tolero,
Ó mundo profano,
Não mais te tolero,
Porque não mais me tolero,
Por ti profanado
E profanizado...
E agora, sem ódios nem desejos,
Sem protesto nem amargura,
Sem saudades nem nostalgias,
Em plena paz Contigo
E quite comigo mesmo,
Entrei no mundo grandioso
Que teus devotos ignoram
Um mundo de gozo sem fastio,
Que amanhece para além de todas as fomes
E de todos os fastios que tu conheces,
Para além de todos os teus ocasos
Na grande Alvorada de Deus...
A grande LIBERTAÇÃO...
(Escalando o Himalaia - Huberto Rohden)