“Não há heróis da ação; há somente heróis da renúncia e do sofrimento.”
Huberto Rohden
Estas palavras sintetizam 90 anos da vida de Schweitzer. Depois de ele ter vivido 52 anos entre os negros primitivos da África; depois de ter realizado obras gigantescas nos mais variados setores da vida — como filósofo, ministro evangélico, músico, organista, como médico e cirurgião, como desbravador e construtor — Schweitzer, num retrospecto panorâmico de quase meio século de atividade terrestre, declara peremptoriamente que ninguém é grande pelo que faz; o homem só é grande por aquilo a que renuncia e pelo que sofre. Esta frase lapidar resume toda a filosofia cósmica do profeta das selvas africanas.
“Quem não renunciar a tudo que tem não pode ser meu discípulo” — estas palavras do Cristo foram realizadas grandiosamente por Schweitzer. Depois de se ter formado em filosofia, teologia e música numa das Universidades da Europa; depois de ter sido ministro do Evangelho, conferencista, maestro de concertos musicais em diversos países, resolve ele abandonar tudo e cortar cerce o início da sua celebridade e desaparecer do cenário europeu para dedicar o resto da sua vida à parte mais atrasada da humanidade num dos piores climas do globo, no meio de povos selvagens incapazes de compreenderem os voos do seu gênio e a grandeza do seu sacrifício.
É opinião geral que Schweitzer tenha feito tudo isto por amor aos negros da África. Não é bem exata essa opinião. Os africanos que ele medicou e operou durante meio século, provavelmente já morreram todos — e que diferença faz terem morrido alguns decênios mais tarde ou mais cedo?
O verdadeiro motivo dessa troca do conforto e da celebridade europeia pelo desconforto e obscuridade da África não foi, a bem dizer, a filantropia pelos africanos. Por detrás de tudo isto se oculta uma razão de ser mais profunda e grandiosa. “Uma só coisa é necessária” — estas palavras de Jesus foram dirigidas à sua discípula Maria de Bethânia, quando ela estava sentada aos pés do Mestre, ouvindo sua palavra e realizando-se espiritualmente.
Todos os homens realmente espirituais agiram e agem pelo mesmo motivo, para realizarem em si mesmos essa “única coisa necessária”.
Huberto Rohden, no livro: “O Profeta das Selvas”